Por Daniel Sangiorgi Salles, engenheiro e diretor da DHLink Sistemas
1. Um problema estrutural que se agrava com o tempo
A construção civil brasileira enfrenta um problema estrutural que se agrava ano a ano: a escassez de mão de obra qualificada.
Embora o fenômeno não seja exclusivo do setor, ele se apresenta com mais urgência nos canteiros de obras. A média de idade dos profissionais da área vem subindo, e não há reposição geracional. O filho do mestre de obras não está indo para o canteiro. O filho do pedreiro também não.
2. O descompasso entre gerações e aspirações
Essa tendência expõe um descompasso entre a dinâmica do trabalho tradicional e as aspirações das novas gerações. Jovens preferem atividades que oferecem maior flexibilidade, autonomia e remuneração rápida. Setores como tecnologia e serviços por aplicativo absorvem grande parte dessa força de trabalho.
Ao mesmo tempo, as exigências do setor de construção – carga física, condições de segurança, jornadas fixas e local de trabalho muitas vezes desconfortável – funcionam como barreiras naturais de entrada.
3. A recusa ao vínculo formal e a informalidade como escolha
Em paralelo, há um fenômeno de recusa ao trabalho formal. Muitos profissionais preferem a informalidade por considerar mais vantajosa a liberdade de não ter vínculo empregatício. Em relatos de executivos do setor, é comum ouvir que, ao propor registro formal, o trabalhador simplesmente desiste da vaga. Prefere entregar comida por aplicativo.
4. Formação técnica: um gargalo que não acompanhou o avanço educacional
A falta de qualificação técnica também é fator crítico. Embora o nível de escolaridade da população tenha aumentado nas últimas décadas, a formação específica voltada para as demandas da construção civil não acompanhou esse movimento.
Os programas de capacitação são escassos, pontuais ou desatualizados. O resultado é um mercado que precisa de mão de obra especializada, mas não encontra profissionais preparados.
5. Um problema multifatorial que exige nova lógica de atuação
O problema, portanto, é multifatorial: falta atratividade, sobram barreiras estruturais e há uma crise de continuidade profissional. Conflitos geracionais também dificultam a formação de equipes integradas, com visões distintas sobre trabalho, hierarquia e produtividade.
Nesse contexto, empresas que atuam com engenharia e instalações complexas buscam soluções técnicas e operacionais para lidar com esse apagão. A robotização de processos, a industrialização dos canteiros, o uso de pré-fabricados e a integração digital são caminhos que ganham protagonismo. Mas isso também exige uma nova lógica de formação, onde a base de conhecimento precisa ser compatível com as tecnologias emergentes.
6. Conclusão: a urgência da transformação estrutural
A construção civil continuará sendo um setor fundamental para o crescimento do país, mas é urgente enfrentar com realismo os desafios de atratividade, qualificação e retenção de profissionais. Do contrário, avanços em produtividade, segurança e qualidade estarão comprometidos.
Fontes:
Relatório Cenários da Construção (CBIC, 2024)
Pesquisa de Tendências Profissionais na Construção Civil (FGV, 2023)
Análise de IA generativa do Google com base em dados do setor